sexta-feira, 11 de julho de 2014

MINHAS MEMÓRIAS DE SÃO LUÍS

"O homem está na cidade
como uma coisa está na outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade" (Ferreira Gullar - Poema Sujo)



Este poema de Gullar representa bem o meu estado de Espírito. Passando dias e dias sem olhar a minha terra querida, sem perceber seu cheiro, seus problemas, sua gente, seu sorriso, seu compromisso consigo e com os seus cidadãos, meu coração entremete-se e respira nas últimas gotas de lembranças, lembranças que tem seu último lugar num livro de Astolfo Serra, Guia Histórico e Sentimental de São Luís do Maranhão, comprado ao singelo preço de R$ 5,00, escondido em um montão de livros sem capa, sem rosto e sem autor, livros, que como as pessoas, brilharam um dia, mas agora, estão renegados ao lixo e ao fogo.
 Fico impressionado como as pessoas amam megalópodes, cidades infinitas, cheias de pessoas sem cara, sem nome, rostos que você vê pela primeira e última vez, violentas massas de seres humanos para quem a vida tem o valor mínimo considerado, pessoas que se esmagam dentro de si e sorriem consigo mesmas; pessoas com pressa, falantes solitárias com um fio ligado a uma bomba guardada dentro da bolsa ou no palito da jaqueta; mas o que mais me deprime, é um outro monte amontoado de gente escura e suja da fuligem que sai do coração financeiro desse lugar, montões e montões de pessoas ávida pelo mínimo pedaço de pão, escuras, escravas e sem alguma dignidade, metendo um medo involuntário em todos que passam em seus possantes carros de marcas europeias, até os jovens temem as peças desse montão sujo. 
Juro que sinto saudades dos ônibus cheios, das ruas escuras, dos buracos do inverno que são um problema à administração pública, saudades das conversas sem sentido, dos sons abertos, das palavras particulares, do calor escaldante, dos olhos julgadores, das matas virgens e grossas e dos lixões da minha São Luís; lamentavelmente, não voltarei até o fim do ano, uma dos golpes mais árduos que minha alma sente em sua existência. De minha memória, pululam lembranças de infância, lembranças de acontecimentos, pessoas, fatos, erros, acertos, amigos, amigas, pessoas que eu vi uma e muitas vezes, lugares particulares, noites de domingo, conversas infinitas e despreocupadas, lembro até do vizinho chato, lembra das ruas, das rotas dos ônibus, das madrugadas, da cama quente, da noite escaldante, do riso dos que me desprezam, até do olhar desconhecido de uma pessoa que passava e num me deu a menor bola, de tudo eu me lembro, sonho todos os dias com essa cidade, lembro todos os dias dela, meus pés estão ávidos para pisar em seu chão, ávidos para sentir seu cheiro úmido e quente como poucos, meus olhos procuram, diariamente, suas matas ciliares e singulares, sua mistura de Nordeste e Norte todos os dias.
Lembro também de sua Avenida Litorânea, Reviver, Rua da Liberdade (leia esse A rua em que as águas são verdes) Bumba-meu-boi, peixe, o feijão mulata gorda da minha cunhada, do arroz com ovo frito, da vinagreira, do maxixe, do pescado no leite de coco e ovo da minha irmã e minha mão, de Quitan, Priscila, Tigrão, Pandora, Raula, Bolota entre outros cachorros que cruzaram minha vida. 
Bem, como eu comecei com uma epígrafe, termino com a representação mais sincera das minhas impressões de onde estou;


Um labirinto místico
Onde os grafites gritam
Não dá pra descrever
Numa linda frase
De um postal tão doce
Cuidado com doce
(...)
Buquês são flores mortas
Num lindo arranjo
Arranjo lindo feito pra você (Crioulo - Não existe amor em SP)